MP estuda recomendar novo fechamento da economia do RN
O Ministério Público Federal no Rio Grande do Norte (MPF/RN), o Ministério Público do Trabalho no Estado (MPT/RN) e o Ministério Público estadual (MP/RN) emitiram nota à sociedade potiguar, nesta sexta-feira (3).
De acordo com a
nota, “a decisão de reabertura das atividades econômicas proposta pelo Estado
do Rio Grande do Norte e pelo Município de Natal/RN não foi respaldada por
dados científicos consistentes”.
Em face de a taxa de transmissibilidade e a ocupação de leitos hospitalares se manterem em niveis elevados, e a ausência de testagens em grande escala, “o Ministério Público, por meio dos três ramos no Estado, estuda a adoção das medidas cabíveis para garantir o enfrentamento adequado da pandemia no Estado e prevenir maiores, mais graves e irreversíveis danos à população.
Veja parte da nota:
NOTA DOS MINISTÉRIOS PÚBLICOS À
SOCIEDADE POTIGUAR:
01. O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, o
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE e o MINISTÉRIO PÚBLICO DO
TRABALHO dirigem-se à sociedade potiguar para se manifestar sobre a reabertura
da economia.
02. No dia 23 de junho de 2020, os
ramos do MINISTÉRIO PÚBLICO neste Estado recomendaram ao governo estadual e a
todos os prefeitos municipais que a retomada das atividades econômicas somente
seria segura se fosse observada desaceleração da taxa de transmissibilidade da
COVID-19 de maneira sustentada, e a ocupação dos leitos públicos de UTI não
fosse superior a 70%, nos termos do art. 12,§1º, do Decreto Estadual nº
29.742/2020.1
03. A Governadora recebeu a
Recomendação e comprometeu-se a cumpri-la, conforme ofício número 513/2020-GAC,
enviado em 23.06.2020, a exemplo do prefeito de Natal/RN.
04. No dia 29 de junho de 2020, a
Governadora do Estado publicou a Portaria Conjunta nº 007/2020-GAC/SESAP/SEDEC,
autorizando a reabertura inicial e gradual da economia, sob o argumento de que
o Comitê Científico estadual teria recomendado o fim do isolamento social,
conforme coletivas de imprensa e mensagens em redes sociais da Governadora e de
representantes do governo, de conhecimento público. No mesmo sentido seguiu o
prefeito de Natal/RN.
05. A Recomendação do Comitê
Científico, porém, somente foi publicada no dia seguinte, apresentando dados
ainda significativamente preocupantes quanto à situação no Estado do Rio Grande
do Norte, especialmente em relação à taxa de contágio e ao número de leitos
críticos de UTI. Além disso, os cientistas foram claros ao dizer que não seria
ainda o momento indicado para a reabertura da economia e o fim do isolamento
social.
06. O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL,
então, oficiou ao Comitê Científico para que explicasse se, de fato, havia recomendado
a reabertura, já que: (a) a Recomendação foi publicada após a decisão do
Governo de retomar as atividades econômicas (de modo que não poderia ser usada
para fundamentar a decisão), e (b) na própria Recomendação do Comitê Científico
consta não ser o momento adequado para o fim do isolamento social.
07. A resposta foi fornecida no dia
02.07.2020, assinada pelo Secretário Estadual de Saúde, falando em nome do
Comitê Científico local, alegando, em suma, que não foi possível garantir o
isolamento ideal, que houve diminuição na taxa de transmissibilidade e que o
novo critério para ocupação segura de leitos teria passado de 70% para 80%,
além de haver perspectiva de abertura iminente de novos leitos.
08. As razões que justificaram a Recomendação Conjunta do MP no dia 23.06.2020 ainda persistem, exatamente porque a taxa de transmissão se mantém alta, a ocupação de leitos críticos é de 90% (noventa por cento) da capacidade e a fila de internação não foi reduzida de forma segura.
09. Em razão da falta de leitos, 249
pessoas perderam suas vidas na fila de regulação. Em estudo realizado pelo
LAIS-UFRN5, publicado em 12 de junho de 2020, fica evidente que a redução do
isolamento social durante a pandemia em Natal, Parnamirim e Mossoró foi fator
decisivo para o aumento do contágio e do número de mortes.
10. Este quadro não foi alterado da
semana passada para hoje. A taxa de transmissibilidade se mantém alta, o
isolamento social está muito aquém do recomendado (principalmente em razão da
deficiência de fiscalização), a taxa de ocupação de leitos está acima de 90% da
capacidade e a expansão anunciada dos leitos ainda não é uma realidade.
11. Portanto, a decisão de reabertura
das atividades econômicas tomada pelo Estado do Rio Grande do Norte e pelo
Município de Natal/RN não foi respaldada por dados científicos consistentes. É
necessário que a sociedade compreenda que:
a) a taxa de contágio continua alta
(no Rio Grande do Norte cada pessoa contaminada, ainda que assintomática,
contagia outras duas pessoas);
b) os leitos de UTI ainda não são
suficientes para a demanda, que se mantém alta;
c) ainda que haja leitos, há deficit
de medicamentos anestésicos e relaxantes musculares necessários para o
procedimento de intubação;
d) o número de mortes no Brasil continua alto (cerca de mil mortos por dia), o que coloca o Brasil no pior lugar no ranking mundial quanto a esse critério de análise.
12. Por outro lado, o Boletim número 09 do Comitê Científico de Combate ao coronavírus do Consórcio do Nordeste, de 02 de julho de 2020, reprova qualquer plano de reabertura da economia. Conforme relata o documento, há uma forte aceleração do processo de interiorização da pandemia em todo o Brasil, com possibilidade concreta de ocorrer o que foi designado como “efeito bumerangue”: o aumento de casos no interior do Estado, já percebidos nos boletins epidemiológicos diários do Rio Grande do Norte, gerará um inevitável deslocamento de pacientes em estado grave para capital.
13. Há uma tendência inequívoca de que a capital se depare com uma “avalanche” de casos graves, advindos do interior, situação que voltará a produzir uma sobrecarga dos seus sistemas hospitalares, ameaçando-os com um colapso em um intervalo de tempo muito curto. Repita-se, a ocupação dos leitos críticos na data dessa nota é de cerca de 90% dos leitos disponíveis.
14. O Estado do Rio Grande do Norte e
o Município e Natal/RN, seja por falta de fiscalização, seja por falta de
maiores esclarecimentos à população, seja por falta de testagem consistente,
exibem curvas de crescimento exponencial mantidas há vários dias, ao contrário
de Estados que mantiveram períodos de isolamento mais rígidos em suas capitais,
como Ceará, Pernambuco e Maranhão, que exibiram uma desaceleração significativa
do crescimento de casos.
15. Experiências de relaxamento açodadas do isolamento social em várias cidades do país, sem o uso de critérios epidemiológicos objetivos indicados, demonstraram ser catastróficas na gestão da pandemia, resultando em decisões dos governantes de retorno ao isolamento, inclusive de forma mais rígida, como bem advertiu o Comitê Científico do Consórcio Nordeste:
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